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Um tempero de outro mundo: o remake tailandês do k-drama “Oh my ghost”

O enredo se desdobra em 16 episódios divertidos, leves e profundos dependendo do seu humor. Gosto de frisar isso porque como boa dorameira que sou, nunca assisto sem me colocar dentro da história e rever desfechos e decisões. Além de corar a cada cena romântica!

O enredo se constrói a partir do triângulo amoroso entre uma jovem fantasma (Khaopun), uma jovem sensível (Jiew) e um chef de cozinha (Artit). A fantasma tem perambulado nos últimos quase 3 anos, desde a sua morte, pela Terra, decidida a resolver suas pendências, para então poder ser recebida no Plano Espiritual. Ela por coincidência (ou destino?) acaba possuindo Jiew que levava uma vida muito difícil exatamente por ser sensível ao mundo sobrenatural (ela via espíritos com frequência). Após perceber que o chef de cozinha do restaurante que Jiew trabalha possui as características que em teoria o fariam suportar um relacionamento com uma fantasma, Khaopun começa trabalhar várias abordagens para conquistá-lo. Foi a minha primeira vez assistindo algo em tailandês e eu gostei, apesar do estranhamento das vozes anasaladas, especialmente as das mulheres. Pelos recortes que vi no YouTube da série original, o roteiro e as ações foram muito semelhantes. Também percebi muita similaridade no jeito de vestir e se portar dos personagens (país tropical é outra coisa, né?). Nota 7/10 pelo enredo e condução. Nota 10/10 pelo drama, eita enredo triste, viu?

ATENÇÃO, SPOILER! Isso mesmo, daqui em diante só leia se curte saber as análises antes de assistir…

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A possessão de Jiew é clinicamente apontada como Transtorno Bipolar. A princípio isso soa mal, a comparação de possessão e doença mental já é por si só problemática e de mal gosto. No entanto, a personagem não sofre exposição, preconceito ou humilhação por conta da condição que tem por parte de quem sabe disso, o chef Artic. Inclusive, embora o gatilho para os episódios de crise tenha parecido ter sido responsabilidade do chef, nós sabemos bem que a relação patrão-empregado é normalmente difícil e tais abusos são comuns. E nesse ponto, eles não tinham se apaixonado (considero que a Jiew tinha admiração grande pelo chef, mas ainda não o sentimento de fato). Ou seja, de fato a mensagem passada na série foi de respeito à doença mental. Como já fui estudante de Psicologia, fascina-me ver sempre em tela os temas relacionados às doenças mentais e condições psicológicas sendo tratados com naturalidade. Porque acredito que muito do preconceito que temos em sociedade é advindo da crença de que há poucos casos, casos isolados, só porque não o vemos na família, vizinhança ou filmes.

Outro ponto que me chamou a atenção é o fato de Artic se colocar como um cara cético, mas ao mesmo tempo não querer acreditar nas coisas sobrenaturais para não ter que fugir ou se preocupar com elas (se eu não acredito em fantasma, por que me assustaria ao saber que há alguns deles no mesmo ambiente que eu?). Esse tipo de contradição pode parecer que foi feito só pelo humor, mas é puramente uma crítica a nós mesmos, a nossa hipocrisia de achar que se repetirmos sempre ideia, quando formos testados, ela será colocada em prática. Como isso poderia ser tão certo? Um homem não se banha duas vezes no mesmo rio…

Ao final da série, percebemos que Jiew era muito parecida com a Khaopun na alegria, simpatia, beleza e serenidade. Só que isso já tinha sido entregue lá no início, quando a fantasma descobre que tinha a mesma frequência de Jiew. Mas naquele momento, a gente até passa batido achando que foi só uma justificativa para uni-las. E aí eu fiquei pensando em quantas Jiews andam por aí, cabisbaixas, acanhadas, envergonhadas. Por questões sociais ou familiares, há muitas mulheres que são podadas, contidas em excesso, que sentem faltam de se expressar, que se sentem presas, que não sabem como se libertar, no sentido mesmo de fazer o querem no seu tempo livre, de conversarem com quem querem etc. E elas eventualmente encontram uma Khaopun em alguma fase da vida: na figura de uma amiga, um novo amor, um trabalho diferente, um hobby…

A forma trágica da morte da Khaopun é revoltante, mas ao mesmo tempo reconfortante. Ela aceita a realidade na qual se encontra e trabalha a saudade enquanto pode. E isso nos ensina tanto! Quantas de nós deixamos de dar atenção à família em vários momentos, apesar de não termos ideia de qual será o nosso último momento? Como sou católica, creio que vivemos aqui e buscamos o Céu desde já. Mas será que entendemos a morte como passagem e não como castigo? A Khaopun fez uma boa ação e pagou com a vida, se soubéssemos disso, estando na condição dela, iríamos aceitar ou nos revoltar?

Eu particularmente tenho apreciado os filmes e séries que retratam a saga de fantasmas, espíritos e etc na busca de conseguirem um certo status. Para mim, a correlação com a nossa vida presente é muito clara e cara, pois quem não se questiona, se acomoda. Todos os dias temos uma nova chance de viver diferente, não é preciso morrer para mudar. E você, como tem vivido?

Aos 20 anos, parei de cursar Psicologia e fui experimentar o que seria (ou mais faria) na vida. Tornei-me servidora pública aos 23. Sou mãe, pedagoga, artesã, doula e (quase) enfermeira. Estão entre as minhas habilidades fabulosas cortar um bolo magnificamente bem, lembrar inúmeros sonhos e fazer vestidos de noiva.

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